"Quando todos os cálculos complicados se revelam falsos, quando os próprios filósofos não têm nada mais a dizer-nos, é desculpável que nos voltemos para a chilreada fortuita dos pássaros ou para o longínquo contrapeso dos astros ou para o sorriso das vacas."
Marguerite Yourcenar, Memórias de Adriano (revista e acrescentada por Carlos C., segundo Aníbal C. S.)

sexta-feira, 31 de julho de 2015

Génesis

Génesis - Exposição de Sebastião Salgado na Cordoaria Nacional (Lisboa)


«Que a luz exista!»



«Que exista um firmamento entre as águas, para as separar umas das outras.»



«Que as águas que estão debaixo do céu se juntem num único lugar e que fique à vista a terra firme.»



«Que a terra produza ervas e plantas que dêem fruto, cada uma conforme a sua qualidade e que o fruto contenha a semente própria.»



«Que existam luzeiros no firmamento, para distinguirem o dia e a noite; e que eles sirvam de sinal para marcar as divisões do tempo, os dias e os anos.»



«Que as águas sejam povoadas de seres vivos e que entre a terra e o firmamento haja aves a voar.»



«Que a terra produza toda a espécie de seres vivos: animais domésticos, animais selvagens e todos os bichos, conforme as suas diferentes espécies.»



«Façamos o ser humano à nossa imagem e semelhança.»



«Que Sebastião Salgado possa fotografar 
a história da criação do céu e da terra.»



terça-feira, 28 de julho de 2015

Jorge Sampaio e o Prémio Nelson Mandela


Jorge Sampaio recebeu, no passado dia 24 (Dia Internacional Nelson Mandela), o prémio com o nome do líder sul-africano, instituído em 2014 e atribuído pela primeira vez este ano.
O prémio, que será atribuído pela ONU de 5 em 5 anos, pretende distinguir quem contribui de forma excepcional em prol da humanidade, a exemplo do patrono do prémio.
Os candidatos eram mais de 200 e penso que é excepcional e uma honra enorme para o país (assim deveria ser) a sua atribuição a Jorge Sampaio.

Não estando "ligado" ao mundo nessa data, não posso confirmar com absoluta certeza a presença activa da comunicação social portuguesa na cerimónia, mas acredito que tenha havido directos em todos os canais televisivos e extensos comentários realizados por paineleiros especializados, a exemplo do que se passou hoje com a vitória do ex-árbitro Pedro Proença para a presidência da Liga de Clubes.
Como diz Teolinda Gersão, "Somos um país inventado pela televisão".



Richard Wright aniversário

Richard Wright fazia hoje 72 anos




Desligado é mais saudável

Uma semana fora, desligado do mundo via comunicação social.
Logo no regresso, mato saudades...


E mais as trapalhices do concurso de professores...



domingo, 19 de julho de 2015

Virgínia Moura

Virgínia Moura, primeira engenheira civil formada em Portugal, grande lutadora contra o regime do Estado Novo, o que a faria passar pelas prisões da PIDE várias vezes, faria hoje 100 anos.

Monumento na cidade do Porto, onde morreu a 19 de Abril de 1998


Futebol de Praia

É na praia que estamos melhor!...

Portugal campeão do mundo em futebol de praia
(da Sábado online)
Há alturas em que me parece melhor as imagens não terem som...


quarta-feira, 15 de julho de 2015

Luta desigual

Independentemente de gostarmos mais ou de gostarmos menos, de concordarmos mais ou de concordarmos menos, de mais ou menos disparates ditos e feitos - e a posteriori é fácil dizer que foi disparate! - a verdade, a preocupante verdade, é a da ultrapassagem dos princípios e dos valores da democracia por outros valores que mais alto se alevantam. Porque alguém deixa. E não devia. E a luta é muito desigual... 


«Enfrentamos uma luta desigual, contra potências financeiras. E deixamos uma marca de dignidade e democracia à Europa. Esta luta vai dar frutos.»
A esperança é a última a morrer.
Será que ainda acreditamos?


Descer é normal, subir carece de explicação

Na educação, outra anedota!


Depois da subida da média das notas dos exames de Matemática do 12.º ano, a descida da média das notas dos exames de Matemática do 9.º ano. 

A subida deve ser inquirida.
A descida não merece comentários. É o que se espera!


Razões incidentais

«Por razões incidentais, não foi possível contar com a equipa inicial desta exposição.»
(Jorge Barreto Xavier, Sec. Estado da Cultura)

Palmas para quem?
O director do Museu demitiu-se há dias, depois do Sec. de Estado ter revogado um despacho assinado por si próprio em que entregava ao Museu o conjunto das obras que agora são apresentadas.

Confusos?
A anedota que é este Sec. de Estado também!

Logicamente, a equipa que preparou a exposição (técnicos e curadores do museu) não esteve presente.
Razões incidentais...


Prémio APE para Mário Cláudio

Mário Cláudio volta a vencer o Grande Prémio de Romance e Novela da Associação Portuguesa de Escritores, com Retrato de Rapaz, 32 anos depois de Amadeo.

«Não vale a pena teimar, meu Menino, nunca mais tentarei espetar-te asas nas espáduas porque o que diz bem contigo, meu Mafarrico, é um bom par de corninhos, e passarás por isso a chamar-te Salai, mas não te vistas por enquanto, vou comprar-te a fatiota que de ti fará um ser humano, nem do Paraíso, nem do Inferno.»



Todos de acordo (quase)

Dizem que é um acordo importante.


Mas a TVI abriu o telejornal com o Casillas!


Ironias (fora de horas)

Pois!... Já não lhe pagam!





"Por acaso foi uma ideia minha!"











terça-feira, 14 de julho de 2015

Dia de Plutão

Porque hoje foi dia de Plutão...
(para que saia das trevas)

Nem toda o homem tem em casa gencianas
no sereno Setembro, pelo S. Miguel lânguido e triste.

Gencianas bávaras, grandes, escuras, só escuras
escurecendo o dia, como archotes com o azul em fumos da treva de Plutão
às nervuras, como archotes, com o fulgor da escuridão espalhada em azul
esbatendo-se em manchas, esbatida sob o impulso do dia branco
flor-archote de treva azul em fumo, no escuro azul ofuscante de Plutão
negros lampadários das mansões de Dis, ardendo azul escuro,
dando escuridão, azul escuridão, enquanto dão luz as pálidas candeias de Deméter,
guiai-me então, mostrai-me o caminho.
Traz-me uma genciana, dá-me um archote!
deixa-me guiar pelo archote azul bifurcado desta flor,
descendo degraus mais e mais escuros, onde em azul escurece o azul,
onde Perséfona agora vai saindo do Setembro das geadas,
rumo ao reino da treva onde no escuro a escuridão fica em vigília
e onde mesmo Perséfona não passa de uma voz
ou de uma invisível escuridão, envolta no mais escuro mais fundo
do abraço de Plutão, trespassada pela paixão da treva densa
entre o esplendor dos archotes de treva que derramam a noite
sobre a noiva perdida e seu esposo.
D.H. Lawrence




Sede ambiciosos!

«Nós, Europeus, temos vivido, em todos os nossos países, momentos terríveis. A história da Europa é uma história dolorosa, cheia de contrastes, de luzes e de sombras, de mudanças extremas entre o bem e o mal. Mas é também uma história de inteligência política. Desde Galileu até aos nossos dias, do Renascimento ao Século das Luzes, a Europa foi acumulando um capital histórico sem igual. É na Europa que se tem alcançado grande parte das mudanças e da evolução que salvaram os homens da desgraça. E será da Europa, que é o mesmo que dizer de nós próprios, que deverá surgir a luz que nos conduzirá à saída do túnel. É a nossa responsabilidade.
O mundo, o mundo que conhecemos, corre perigo de morte. Pode perecer devido à injustiça social e económica ou devido à injustiça ecológica. Ou por causa de ambas. Não podemos permitir que isso aconteça. Temos de abrir um novo caminho. Precisamos de uma visão construtiva para edificar um novo futuro. 
Para isso, precisamos de ambição. A ambição que nasce da confiança em nós mesmos e da coragem Não podemos cair no optimismo dos que acham que as coisas se resolverão por si próprias nem no pessimismo dos que acreditam que nada há a fazer.
Sede ambiciosos! Não nos rendais!»
Stéphane Hessel, Não vos rendais!


Está difícil ver a luz...
Outras ambições mais fortes se levantam.

Nikias Skapinakis, Enlevo de Miss Europa

Olhares...


Não sabemos da alma senão da nossa;
As dos outros são olhares,
são gestos, são palavras,
com a suposição
de qualquer semelhança
no fundo.
Fernando Pessoa





Oxi




terça-feira, 7 de julho de 2015

Cortiça esfoliante

Esfoliante ou exfoliante?
O (meu) Grande Dicionário da Língua Portuguesa, de José Pedro Machado, anterior ao AO, só contempla a versão com x.
Mas o que me interessa, agora, é a cortiça.
E passo a fazer publicidade:
 
«(...)
Na verdade, até pode ser massajado à sombra de um sobreiro e comprar sabonetes artesanais de cortiça, com propriedades esfoliantes.
(...) decidiu desenvolver uma massagem de assinatura, única e que utiliza grânulos de cortiça para efectuar uma suave esfoliação. Trata-se de uma massagem com a duração de 1h 15, que relaxa e liberta tensões musculares, estimula o sistema imunitário e previne o envelhecimento da pele através de uma suave esfoliação com grânulos de cortiça e mel da região, usando o aroma do alecrim (ou outro aroma campestre) para um resultado de hidratação e bem-estar. A parte final da massagem volta a socorrer-se da cortiça, da qual são feitos os rolos que percorrem o corpo com uma função relaxante. Esta massagem tem um custo de €65.»
Sobreiro (gigante! Uma sobreira) do Monte do Giestal
Em Santiago do Cacém (ou lá para essas bandas!...)



Uma nova relação com as coisas

«Ele vislumbrou uma nova relação com o real, feita já não de oposições e distâncias, como se a vida não fosse um mistério único, mas sublinhando corajosamente os traços de união, os hífenes inesperados, as continuidades. E assim nos mostra que não há pequeno ou grande, não há cósmico nem quotidiano, não há interno ou exterior: por todo o lado e em todas as coisas está, pelo contrário, latente a mesma espantosa proposta que a vida em si mesma é.»

Texto (de despedida) da autoria de José Tolentino de Mendonça, sobre Alberto Vaz da Silva, hoje falecido.
Advogado, dedicado à grafologia, muito ligado ao círculo dos chamados católicos progressistas, aqueles que a partir da década de 1950 e até ao 25 de Abril, com destaque para o período do marcelismo, dinamizaram o Centro Nacional de Cultura, de que a sua esposa, Helena Vaz da Silva, foi presidente de 1979 a 2002, data da sua morte.
É uma geração que vai desaparecendo.

Almoço de Católicos para o Socialismo
(João Bénard da Costa, o 1.º da esq., Sophia de Mello Breyner, de óculos escuros,
Helena Vaz da Silva, 2.ª à direita, Alberto Vaz da Silva, o último da fila da direita)


Maria Barroso

Uma vida rara (para uma mulher, num país como Portugal, pós-1926).

1925 - 2015






«Uma cidadã modesta mas amante da liberdade, da solidariedade e do amor.»
(auto-memória)





DEPOIS DE MIM

Um dia (sei-o bem)
os campos ficarão eternamente floridos
e a chaga que me inquieta
deixará de sangrar em todos os peitos.
Os homens já não estarão curvados sobre as terras
e a leiteira não virá mais trazer-me as bilhas com o seu ar de humildade.

A mulher dos ovos e o homem da fruta,
o rapaz pobre envergonhado de dizer: eu sei,
o camponês prestando contas da estação,
os vultos negros do subsolo,
a linda mãe solteira,
deixarão de sorrir com humildade.

Humildade ficará nos dicionário como esqueleto em museu arqueológico.
Eu próprio nunca mais farei baixar as pálpebras
e deixarei que o sol me inunde bem nos olhos.

Um dia
(ah sinto-o bem para além das milhentas folhas de todos os tratados)
uma onda de amor invadirá tudo e todos.


Mário Dionísio (Poemas - 1936-1938)


domingo, 5 de julho de 2015

Aos Joães Sem Medo

«Era uma vez um rapaz chamado João que vivia em Chora-Que-Logo-Bebes, exígua aldeia aninhada perto do Muro construído em redor da Floresta Branca onde os homens, perdidos dos enigmas da infância, haviam instalado uma espécie de Parque de Reserva de Entes Fantásticos.
Apesar de ficar a pouca distância da povoação, ninguém se atrevia a devassar a floresta. Não só por se encontrar protegida pela altura descomunal do Muro, mas principalmente porque os choraquelogobebenses - infelizes chorincas que se lastimavam de manhã até à noite - mal tinham força para arrastar o bolor negro das sombras, quanto mais para se aventurarem a combater bichas de sete bocas, gigantes de cinco braços ou dragões de duas goelas. Preferiam choramingar, os maricas!, agachados em casebres sombrios, enquanto lá por fora chovia com persistência implacável (como se as nuvens estivessem forradas de olhos) e dos milhares e milhares de chorões - as árvores predilectas dessa gente - pingavam folhas tristes. Tudo isto incitava os habitantes da aldeia a andarem de monco caído, sempre constipados por causa da humidade, e a ouvirem com delícia canções de cemitério ganidas por cantores trajados de luto, ao som de instrumentos plangentes e monótonos.
O único que, talvez por capricho de contradizer o ambiente e instinto de refilar, resistia a esta choradeira pegada, era o nosso João que, em virtude duma contínua ostentação de bravata alegre e teimosa na luta, todos conheciam por João Sem Medo.
Ora um dia, farto de tanta chorinquice e de tanta miséria que gelava as casas e cobria os homens de verdete, disse à mãe que, conforme a tradição local, lacrimejava no seu canto de viúva:
- Mãe: não aturo mais isto. Vou saltar o Muro.»

José Gomes Ferreira, Aventuras de João Sem Medo

Dedicado aos Joães Sem Medo da Grécia - "há sempre alguém que resiste, há sempre alguém que diz não", mesmo que não se saiba o que está do outro lado do Muro.
Que se saiba que há várias formas de não se ser piegas!


sexta-feira, 3 de julho de 2015

Não é inteligente

Encontrei esta história, supostamente medieval.

«Certo dia, dirigindo-se os dois, a pé, à feira da vila mais próxima e durante o caminho, ao avistar um monte de esterco, o senhor diz ao seu servo:
- Dou-te uma moeda se comeres aquela bosta.
O servo pensa, o máximo que a fama da sua pouca inteligência conseguia, e imagina tudo que poderia fazer com uma moeda. Sem muito se interrogar sobre o porquê daquela proposta, habituado a sacrifícios, aceita e engole, conforme pode, a bosta. O senhor dá-lhe a moeda e os dois continuam o seu caminho.
Contudo, o senhor reflecte e diz a si próprio que se limitou a perder uma moeda e não lhe pareceu que comer a bosta tenha feito mal ao seu servo. Ao avistar um segundo monte de esterco, o senhor pára e diz ao servo:
- Se eu comer aquela bosta, devolves-me a moeda?
- Está bem, combinado – diz o servo, sem pensar muito no assunto.
O senhor deita mãos à obra e, com grande sacrifício, resmungando, engasgando-se, engole a bosta até ao fim.
Continuaram os dois a andar. Passado uns minutos, o servo pergunta ao senhor:
- Já que vós, senhor, sois tão inteligente, não me podeis dizer a razão pela qual comemos aquela merda toda?»

Lembrei-me das negociações entre a Grécia e as instituições europeias.



No tempo dividido












A memória longínqua duma pátria
Eterna mas perdida e não sabemos
Se é passado ou futuro onde a perdemos
Sophia de Mello Breyner Andresen
I (do conjunto Poemas de um livro destruído),
No tempo dividido


Tecnocratas pedantes que detestam a democracia



«O resgate da Grécia não teve em consideração nem o interesse do povo grego nem o interesse da Europa, mas apenas se destinou a salvar os bancos alemães e franceses e os ricos oligarcas gregos.»
Karl-Otto Pöhl, ex-presidente do Bundesbank, em entrevista ao Der Spiegel (18 de Maio de 2010)

E vem um (dito) social-democrata falar num governo tecnocrata?
«Tecnocratas pedantes que detestam a democracia.» (frase de José Pacheco Pereira)

«Se pensarmos como a direita pensa, acabamos a governar como a direita governou.", disse António Costa.
Como é que acabaremos?


quarta-feira, 1 de julho de 2015

Um segundo a mais


Se me tivessem dito antes, tinha planeado o dia de outra maneira.


Dia das Bibliotecas

«Durante o jantar, dissertámos sobre a felicidade e maldição a que estamos condenados: os livros são caros no acto da compra, não valem nada na revenda, assumem preços incomportáveis depois de esgotarem, são pesados, acumulam pó, sofrem com a humidade e os ratos, a partir de uma certa quantidade tornam-se quase impossíveis de transportar de uma casa para outra, necessitam de uma classificação precisa para poderem ser utilizados e, sobretudo, devoram espaço.»
Jacques Bonnet, Bibliotecas cheias de fantasmas

Vieira da Silva, La bibliothèque humoristique